2012 se encerra. Quis deixar uma última postagem aqui no meu humilde “blog do Caronte”. E depois de pouco pensar resolvi traduzir em palavras o que em 2012 se sedimentou em minhas convicções.
Em 2012, como sempre, continuei olhando pro céu e pensando no pálido ponto azul que somos no cosmos. Embora ínfimo, é a nossa casa, assim aprendi com Carl Sagan. Aqui estão todos que amamos, odiamos, conhecemos e se nada mudar radicalmente é aqui que habitaremos por muitos e muitos anos. Aqui vivemos nossas alegrias e nossos sofrimentos, crenças e descrenças, congruências e incongruências, ideologias e doutrinas. Aqui somos heróis e covardes, criadores e destruidores, inventores e exploradores, aqui vivem os mestres da ética, os políticos corruptos, famosos e anônimos, tudo neste pequeno e improvável pálido ponto azul. Somos ínfimos na imensidão que nos cerca.
Em 2012 aprendi com o físico Marcelo Gleiser, que isso não diminuí o papel que temos no cosmos. Ao contrário, isso aumenta nossa responsabilidade, provavelmente somos únicos. Dádiva e maldição. Se a primazia da criação der errado, nossa unicidade nos fará sermos o maior fracasso do universo.
Em 2012 continuei olhando para o passado na esperança de não cometer os mesmos esdrúxulos erros no futuro. Olhei o mar de sangue derramado durante a Segunda Guerra e mais ainda no absurdo da matança da era da Escravidão declarada. Pensei nas crueldades sem fim infligidas pelo ódio desenfreado, pela intolerância inexplicável. Mas o pior é ver no dia a dia estas mesmas ignóbeis atitudes acontecendo. A religião A que se acha superior e mais detentora de direitos que a B e C. Nunca aprenderemos a não cometer velhos erros? Por quanto tempo as incompreensões? Por quanto tempo seremos desejosos de aniquilar o outro? Por quanto tempo mais durará nossos ódios? A escuridão que nos cerca no espaço é mais salpicada de pontos de luz do que nossas atitudes hodiernas.
Em 2012 li e reli Carl Sagan, de quem transcrevo um pequeno fragmento: “A Terra é o único mundo conhecido, até hoje, que alberga a vida. Não há mais algum, pelo menos no próximo futuro, para onde a nossa espécie possa emigrar. Visitar, pôde. Assentar-se, ainda não. Gostando ou não, por enquanto, a Terra é onde teremos de ficar. O que acentua a nossa responsabilidade para nos portar mais amavelmente uns para com os outros, e para protegermos e acarinharmos o pálido ponto azul, o único lar que tenhamos conhecido. O pálido ponto azul”.
Em 2012 li e reli a velha carta que o grande Cacique Seattle enviou ao presidente americano em 29 de outubro de 1887, esta carta vale ser relida em alguns trechos, especialmente em um ano em que assistimos, impassíveis, a dizimação dos índios Guarani-Kaiowá. Como nossos índios, o Cacique não podia vender suas terras e assim falava ao líder Americano: “Como podes comprar ou vender o céu, o calor da terra? Tal ideia nos é estranha. Se não somos donos da pureza do ar ou do resplendor da água, como então podes comprá-los?(...) Cada torrão desta terra é sagrado para meu povo, cada folha reluzente de pinheiro, cada praia arenosa, cada véu de neblina na floresta escura, cada clareira e inseto a zumbir são sagrados nas tradições e na consciência do meu povo. (...) O homem branco esquece a sua terra natal, quando - depois de morto - vai vagar por entre as estrelas. (...) Se te vendermos a terra, terás de te lembrar que ela é sagrada e terás de ensinar a teus filhos que é sagrada e que cada reflexo espectral na água límpida dos lagos conta os eventos e as recordações da vida de meu povo. O rumorejar d'água é a voz do pai de meu pai. (...) Nossos modos diferem dos teus. A vista de tuas cidades causa tormento aos olhos do homem vermelho. Mas talvez isto seja assim por ser o homem vermelho um selvagem que de nada entende. (...) Sou um selvagem e desconheço que possa ser de outro jeito. (...) Sou um selvagem e não compreendo como um fumegante cavalo de ferro possa ser mais importante do que o bisão que (nós - os índios) matamos apenas para o sustento de nossa vida”.
Em 2012 ao reler este texto incrível do nobre indígena esta última parte é a que mais quero assimilar e deixar como legado aos meus: “O que é o homem sem os animais? Se todos os animais acabassem, o homem morreria de uma grande solidão de espírito. Porque tudo quanto acontece aos animais, logo acontece ao homem. Tudo quanto acontece aos animais, logo acontece ao homem. Tudo está relacionado entre si. Deves ensinar a teus filhos que o chão debaixo de seus pés são as cinzas de nossos antepassados; para que tenham respeito ao país, conta a teus filhos que a riqueza da terra são as vidas da parentela nossa. Ensina a teus filhos o que temos ensinado aos nossos: que a terra é nossa mãe. Tudo quanto fere a terra - fere os filhos da terra. Se os homens cospem no chão, cospem sobre eles próprios. De uma coisa sabemos. A terra não pertence ao homem: é o homem que pertence à terra, disso temos certeza. Todas as coisas estão interligadas, como o sangue que une uma família. Tudo está relacionado entre si. Tudo quanto agride a terra, agride os filhos da terra. Não foi o homem quem teceu a trama da vida: ele é meramente um fio da mesma. Tudo o que ele fizer à trama, a si próprio fará”.
Peço desculpas pelo longo texto, mas coisas desta importância carecem um pouco mais de prolixidade. E para finalizar e desejar um 2013 muito bom, deixo as últimas palavras do Cacique Seattle em sua carta. Bom ano de 2013 para todos.
“Os nossos guerreiros sucumbem sob o peso da vergonha. E depois da derrota passam o tempo em ócio, envenenando seu corpo com alimentos adocicados e bebidas ardentes. Nem o homem branco, cujo Deus com ele passeia e conversa como amigo para amigo, pode ser isento do destino comum. Poderíamos ser irmãos, apesar de tudo. Vamos ver, de uma coisa sabemos que o homem branco venha, talvez, um dia descobrir: nosso Deus é o mesmo Deus. (...) Os brancos também vão acabar; talvez mais cedo do que todas as outras raças. (...) Nunca esqueças de como era esta terra quando dela tomaste posse: E com toda a tua força o teu poder e todo o teu coração - conserva-a para teus filhos e ama-a como Deus nos ama a todos. De uma coisa sabemos: o nosso Deus é o mesmo Deus(...) Nem mesmo o homem branco pode evitar o nosso destino comum.”